Candidato à presidência do PT de Aracaju, Camilo Daniel acusa Edvaldo de perseguir o partido e defende sua reoxigenação
- André Carvalho
- 22 de mai.
- 19 min de leitura

O Partido dos Trabalhadores passará por seu Processo de Eleição Direta (PED) para as direções municipais, estaduais e a nacional, com a participação do voto direto dos filiados. Em Aracaju, duas chapas disputam o comando do diretório da capital. A “Construindo uma Nova Aracaju”, liderada por Sissa Carvalho, e a “Militante Presente”, liderada pelo vereador Camilo Daniel, entrevistado de hoje no Sergipense.
Camilo Daniel é cientista social pela UFS e atualmente ocupa uma vaga de vereador de Aracaju, além disso, é militante do Movimento Sem Terra (MST). Representante da corrente Esquerda Popular Socialista, sua candidatura conta com o apoio das correntes Articulação de Esquerda, Resistência Socialista, Movimento PT e de uma parte da Construindo um Novo Brasil.
Candidato à presidência do diretório municipal do PT de Aracaju, Camilo entende que é preciso reoxigenar o partido e torná-lo mais atrativo para quem deseja militar por uma plataforma política alinhada à do petismo. Para ele, é preciso reconstruir os núcleos de base e o dialogo do partido com a sociedade aracajuana para o partido sair do período de baixa e avançar num período de crescente — que, segundo a perspectiva dele, já está em curso.
O candidato entende que o partido enfrenta bem a ascensão da extrema-direita em Sergipe, conseguindo formar parte da opinião pública, mas, para transformar isso em êxito eleitoral, é preciso reorganizar o partido.
Questionado sobre aproximação com o grupo governista, defendida por parte do PT, Camilo entende que o PT cresce mais distante desse caminho. O petista avalia que Fábio Mitidieri (PSD) é responsável por um governo neoliberal que ataca o serviço público, mas a maior divergência vem com Edvaldo Nogueira (PDT). Camilo atribui a Edvaldo uma perseguição ao PT que afetou sua capacidade eleitoral, atuando fortemente para desfazer suas chapas nas últimas eleições. Além disso, acusa o ex-prefeito de sucatear a cidade Aracaju e desconstruir o legado que Marcelo Deda deixou na prefeitura de Aracaju.
Com relação ao PSOL, Camilo acredita que um alinhamento de objetivos entre ambos os partidos faria bem à esquerda sergipana e tornaria uma candidatura única desses partidos à prefeitura de Aracaju fortemente competitiva.
Leia abaixo a entrevista na íntegra.

André Carvalho (AC): Por que disputar a presidência do PT de Aracaju?
Camilo Daniel (CD): Durante esse último período, o PT tem sofrido baixas significativas. Em Aracaju, especificamente, a gente já saiu de cinco vereadores e prefeitura, para ter hoje Camilo como vereador. Nós já tivemos o vice-prefeito, já chegamos ao mais alto cargo, já tivemos presidência da câmara, mas a gente esteve numa baixa. Hoje, avalio que a gente está numa crescente.
Abrindo um parêntese: a gente tem um problema nacional, na minha avaliação, que afetou muito o nosso voto e o nosso rendimento em Aracaju, mas, tivemos um segundo fator que foi a morte de Zé Eduardo e de Marcelo Déda, que eram duas grandes referências e que ajudavam a organizar muito o partido.
Então, presidir o PT Aracaju, nesse período, significa retomar o protagonismo que o PT tem na cidade de Aracaju. Lógico que o Brasil inteiro sofreu com o problema da Lava Jato, a prisão de Lula, o golpe contra a presidenta Dilma; isso afetou diretamente o PT em todo o país, mas acho que a gente entra, agora, num processo de crescimento do PT. Um processo de novo fluxo de crescimento do PT. Então, quero presidir o PT para retomar o protagonismo do partido aqui na cidade.
AC: Com o apoio de quais correntes sua candidatura conta?
CD: Hoje, a gente tem apoio da Articulação de Esquerda, da Resistência Socialista, de muitos companheiros da CNB, do Movimento PT e, particularmente, sou da EPS. São essas correntes que nos apoiam nessa caminhada.
AC: Quais são as principais propostas e a plataforma que você apresenta aos filiados do PT?
CD: Acho que a principal coisa que a gente quer construir no Partido dos Trabalhadores é a retomada dos núcleos de base na organização do PT. O PT é um partido que teve uma marca nos anos 80 e 90 pela forma como ele se construiu em diálogo com a militância. Então, você sempre teve um partido muito militante e essa militância com muito protagonismo. Durante esse último período, isso daí acabou virando uma tendência, por conta da força dos parlamentares dentro do partido, e obviamente que isso não é uma coisa só do Brasil. Se você for olhar a social-democracia francesa, vários outros partidos assim, se constrói aí um distanciamento muito grande entre o partido e a base da sociedade. O partido passa a ser meio que um conglomerado de deputados.
Então, eu acho que teve esse fator, mas acredito que a gente está em outro no outro momento da política. E se o partido não conseguir dialogar diretamente com o povo, a gente não consegue sair dessa crise que fez o fascismo crescer com muita força aqui no estado de Sergipe e no país. Então, acho que a saída para gente, politicamente, passa por uma reformulação e uma rearticulação com o povo.
A gente precisa voltar a ter o partido que tenha núcleos de base em fábricas, em supermercados, em locais de trabalho, nas universidades, nas grandes escolas, nas comunidades. Porque hoje é perceptível também que houve uma mudança muito grande no mundo do trabalho. Você tem aí nos anos 80 as fábricas que comandavam boa parte do trabalho assalariado no país, hoje muita gente trabalha inclusive fazendo entrega de aplicativo, muita gente trabalha de forma autônoma. Então, a gente precisa ter também essa organização nos bairros, que são as organizações territoriais. Acho que essa daí é a principal questão.
Para a gente retomar o protagonismo do partido, a gente precisa ter, automaticamente, a reorganização a partir de núcleos de base. Essa, na minha avaliação, é a principal proposta que a gente carrega.
AC: O PT que temos hoje em Aracaju consegue enfrentar a ascensão da direita ou é preciso que o partido se reorganize para esse desafio?
CD: Acho que, hoje, a gente enfrenta muito bem a extrema-direita. Acho, inclusive, que a gente consegue orientar uma parte da opinião pública na cidade. Mas, para a gente conseguir ter o protagonismo que o PT merece e que a cidade precisa, e que o povo quer, a gente precisa de fato de uma reoxigenação disso. E isso envolve trazer novos filiados, preparar novos quadros, a gente estar por todo canto da cidade, com novas lideranças, fomentando a organização desses trabalhadores e dessas comunidades. Mas, pessoalmente, acho que a gente enfrenta bem.
Posso citar um caso: eu, por exemplo, não acho que Emília Correia virou prefeita da cidade porque Aracaju é reacionária, ou porque a cidade de Aracaju é de extrema-direita. Eu não acho isso! Acho que Emília Corrêa foi a candidata em oposição ao bloco do governo que ganhou a eleição por conta desse desgaste. Não por acaso eu vi muitos sindicalistas, professores, muita gente pedindo voto. Então, eu acho que teve esse fenômeno aí.
Pós-eleição, início de mandato dela, nós tivemos um primeiro enfrentamento entre nós, o PT, nosso mandato, e a gestão de Emília quando ela vetou o projeto de lei de minha autoria sobre o condicionamento dos recursos de subsídio para empresas que tivessem certidão, que não tivessem débitos trabalhistas. Na minha avaliação, ela vetou esse projeto e a gente ganhou a opinião pública da cidade. A gente conseguiu demonstrar para a cidade de Aracaju a imoralidade que era os repasses de subsídio que a prefeitura fazia para as empresas.
Foi tão grande o desgaste que ela sofreu no debate público, que ela perdeu, que ela, inclusive, tirou Progresso de circulação da cidade por conta disso. Então, eu acho que a gente não só está muito preparado para combater a extrema-direita em Aracaju, como acho que a gente tem ganhado na opinião pública e no debate público. Agora, obviamente, para o PT ganhar eleições a gente precisa reorganizar o partido.

AC: O PT tem diversas divisões, por ser um partido que valoriza a democracia interna, entretanto, uma divisão mais visível ofusca as demais diferenças. Há um grupo do PT que defende uma aliança com o grupo governista de Fábio Mitidieri, tendo, inclusive, apoiado o candidato governista para a prefeitura de Aracaju desde o primeiro turno no ano passado, mesmo o PT tendo candidato próprio. De outro lado, um grupo que defende que o partido se mantenha na oposição. Qual a posição da sua candidatura sobre esse debate? Defende se aproximar de Mitidieri ou buscar protagonizar a frente de oposição?
CD: Eu acho que minha posição sempre foi muito dura com relação a isso. A gente tá na oposição do governo do estado, tá na oposição a Prefeitura de Aracaju, eu já estive na oposição da gestão Edvaldo, passada, e acho que vale a pena pontuar todas as coisas aqui. Hoje, por exemplo, a gente tem um grande problema de chuva e alagamento na cidade. Emília tem cinco meses de gestão, ela tá deixando a cidade suja e parte desses alagamentos é consequência dela, dessas ações. Mas, se tem um DNA responsável pelos alagamentos na cidade de Aracaju, é o de Edvaldo Nogueira!
Edvaldo governou a cidade por quatorze anos. Nesses quatorze anos, Edvaldo enterrou todas as ideias de plano-diretor que a cidade tinha e governou a cidade completamente vinculada aos interesses empresariais. Estávamos na oposição por isso.
Você pega o governo Fábio Mitidieri, é um governo neoliberal que apostou no aprofundamento das privatizações e não é para melhorar o serviço público — privatização não melhora o serviço público. Mas ele apostou nisso fazendo um debate muito rasteiro e tentando jogar a sociedade contra os serviços públicos. Mitidieri protagonizou, por exemplo, a venda da Deso. Um absurdo!
Ele inclusive diz que não é privatização, que é concessão, mas o talão da Iguá já começou a chegar na casa do povo. E a tendência é que nos próximos três ou quatro anos a gente comece a ter muitos aumentos no valor dessas tarifas.
Então, o governo Mitidieri é um governo que ele chegou a criar inclusive uma agência que se coloca como a captação de investimentos, a Desenvolve-se, mas a perspectiva dela é organizar a privatização das empresas públicas do estado de Sergipe. Lembro, inclusive, que na votação da criação das microrregiões da Deso, eu estava na Assembleia acompanhando a votação já na madrugada, ali perto do Natal, com o pessoal do SINDISAN, e eu lembro que no pacote da privatização da Deso, ainda entrava um novo projeto de lei que permitia que as empresas que não fossem lucrativas elas deveriam ser extintas. Ou seja, você vai impedir a Deso de funcionar, mas você mesmo não acaba. Você espera ela dar prejuízo que naturalmente ela vai dar, porque ela deixa de captar recurso, para depois extingui-la.
Então, é um governo completamente neoliberal que se apega em festas para tentar crescer um pouco na sua popularidade, mas é um governo completamente neoliberal. Por isso que nós somos oposição ao governo Mitidieri.
Na minha avaliação, o PT se saiu muito bem na eleição passada. A gente podia ter ganhado a eleição do governo do estado com o senador Rogério Carvalho se a gente não tivesse alguns fatores ali no meio daquele processo eleitoral. E coisas que ninguém imagina que podem levar para um lugar ou para outro no resultado da eleição. Ou seja, ninguém tem culpa disso, são fatores que acontecem na política e que depois a gente observa, analisa. Agora, a minha avaliação disso tudo é que a gente se saiu muito bem na eleição passada e o PT voltou a ter protagonismo. Veja, a última vez que a gente, o PT, foi para o segundo turno foi com o Déda governador em 2010. Então, você tinha doze anos praticamente que o PT não governa mais o estado de Sergipe. O PT chegou a ser vice-governador ali com a Eliane, mas o PT construiu uma marca na oposição com o senador Rogério e a gente chegou muito bem.
Um partido que tem Ministro da República aqui no estado, que tem Senador da República, que tem deputado federal. Veja, é um partido que se a gente conseguisse bater em combate, a gente combater todo mundo junto dentro de um propósito da retomada do governo do estado, a gente daria muito fortalecido aqui. Agora por que isso não acontece? Porque, infelizmente, tem um bloco dentro do PT que desde o primeiro mês do governo de Fábio buscou se alinhar com ele. Isso aí é público, a cidade, o estado de Sergipe sabe.
Inclusive, numa entrevista, cheguei a comentar que existe muita omissão, porque, por exemplo, o caso da Deso é um absurdo. Você vai colocar a sua digital nisso?! “Ah, eu não tenho nada a ver, porque é culpa do governador”, mas é isso, você faz parte ali de alguma forma, você busca se aproximar… você coloca uma capa de republicanismo para aumentar as suas relações e, no fim das contas, você presta qual serviço para a esquerda e para o partido?
Então, nossa posição aqui é que o Partido dos Trabalhadores tenha candidatura própria. Obviamente que hoje não tem um nome colocado para disputar o governo do estado. Não existe isso. O nosso principal nome é o senador Rogério. Ele é candidato a senador, vai para reeleição. Mas defendo que o PT consiga construir uma candidatura do Partido dos Trabalhadores para disputar o governo do estado, demarcar o que a gente pensa para o estado de Sergipe.
Eu não tenho dúvida nenhuma que a saudade que o povo mais tem no estado de Sergipe é de voltar ver o PT voltar a governar esse estado. Então, qualquer candidatura que o PT lançar, ela é muito competitiva. Não tenho dúvida disso.

AC: O mundo mudou radicalmente nas últimas décadas, afetando a forma como a classe trabalhadora se organiza e se enxerga. Como a sua candidatura entende que o PT deve atuar nesse novo cenário para continuar sendo o partido dos trabalhadores? Quais táticas o partido deve manter e quais precisa rever ou adotar?
CD: A principal agenda política que o PT precisa adotar para esse período é encampar com mais força o fim da jornada 6x1. A gente tem uma pauta hoje que tá no Congresso Nacional que felizmente, através da mobilização de Erika Hilton e do vereador Rick Azevedo, tem crescido. Obviamente que foi um projeto defendido lá atrás com Paulo Paim e por outros atores aí do PT, que lançaram. Zero problema com isso. Mas agora ele ganhou um corpo na sociedade muito grande, então, na minha avaliação, essa é a bandeira número um que o PT tem que construir durante esse período.
É preciso encampar com muita força o fim da jornada 6x1. Isso daí passa por um processo de uma nova regulamentação no mundo do trabalho que vai reaproximar o partido e o governo da classe trabalhadora que a gente tem. E por que eu digo isso? Observe. Não é por acaso que você tem uma febre praticamente na sociedade que são as bets, o tigrinho, os jogos… na verdade, toda a sociedade, quem tem rede social, Instagram, olha a vida de famosos e de influencer e quer aquilo para si. Uma vida de luxo, uma vida de academia e aí as pessoas começam a buscar horizontes para isso.
Se você olhar como é que é a verdadeira a nova classe do trabalho, vamos dizer assim, a nova classe trabalhadora, como ela tá sobrevivendo na atualidade… assim, quem tá na política precisa com urgência entender isso como algo prioritário. É coisa de não ter folga, né?! Isso os que trabalham de carteira assinada, e os que não trabalham? E os que tem que fazer diária? Então, eu acho que esse daí é o ponto número um. O ponto central é esse.
Além disso, a gente tem alguns traços que o Governo Federal precisa ajudar um pouco mais, na minha avaliação, com algumas medidas mais populares. Obviamente que o presidente Lula, depois de seis anos, ele passa a valorizar mais uma vez o salário mínimo, então a gente tem mais de trezentos reais de aumento no salário mínimo durante esse período, ele passa a colocar o projeto de isentar até cinco mil reais do imposto de renda. São ações muito importantes, mas acredito que elas ainda estão muito aquém da esperança que essa classe trabalhadora aguarda do governo do presidente Lula.
Temos muitos desafios pela frente. Acho que o governo tem que protagonizar esse novo momento criando mais direitos e acho que a gente não pode perder no debate, quando você não consegue avançar no debate, no diálogo. Por exemplo, o governo perdeu no debate com relação aos aplicativos. Tentou regulamentar, criar uma aposentadoria especial… acabou perdendo no debate com os aplicativos. A gente precisa ter uma ação ouvindo esses trabalhadores, que a gente consiga de fato encampar uma peleja, que refaça nossa hegemonia na classe trabalhadora. Isso obviamente só o governo pode fazer.
E acho que para o PT tem desafios e o principal dele está no que falei antes: ou a gente se reorganiza, se reconstrói territórios, refaz núcleos de base, reorganiza isso, tratar mais perto do povo e a partir deste tato com a população, conseguir representar melhor os interesses desse povo ou fica na história. A gente precisa reoxigenar esse partido.

AC: Quais os principais desafios que enxerga para o PT em Aracaju?
CD: O principal desafio é recuperar o nosso protagonismo na cidade. É esse o principal desafio. Se a gente trata disso como um grande guarda-chuva, você passa a ter nele as tarefas para gente fazer. É eleger mais vereador, então é construir uma chapa mais forte para disputar a eleição de vereador. Mas nada disso é feito se o PT não tiver organização nas comunidades para trazer novas lideranças para ser candidatas. É disputar prefeitura e ganhar a eleição, agora, nada a gente consegue se não tiver candidatos a vereador, uma nova chapa, novas lideranças e trabalho. Então, na minha avaliação, o principal desafio nosso é esse: é retomar o protagonismo que sempre foi petista em Aracaju.
AC: Em 2012, o PT obteve 29 mil votos para vereador em Aracaju. Nas eleições seguintes, esse número foi caindo, até chegar a 11 mil votos em 2024. A que você atribui essa perda de força eleitoral do partido na capital?
CD: Tem alguns motivos. Primeiro deles é que tivemos muito voto no cenário no qual o PT ocupava a prefeitura ou a vice-prefeitura. Então, quando você está na posição de prefeito da cidade ou está na posição majoritária, você consegue organizar muito melhor essas chapas de vereadores e trazer novas lideranças. Porque a gestão tem contato direto com o povo diariamente, ela sempre sabe qual é a liderança comunitária que luta para resolver os problemas do bueiro que está tampado. E sabe que automaticamente essa liderança ela tem potencial eleitoral e dá para o partido investir melhor nisso.
Então, eu acho que o primeiro fator é esse. Lá atrás a gente tinha muito voto porque a gente ocupava a posição de destaque. A gente governava Aracaju. Acho que esse daí é o primeiro ponto.
Segundo é que antes a gente tinha duas lideranças que tinham uma capacidade muito forte. Uma, por ser liderança e ter uma densidade eleitoral, que era Marcelo, e outra pela capacidade organizativa que tinha no partido, que era Zé Eduardo. Essas duas figuras morreram muito precocemente. E eram figuras que construíram o PT.
Veja que o protagonismo do PT em Sergipe está atrelado diretamente a essas duas pessoas. O PT vem a ter deputado quando Déda é eleito, junto com Renatinho, obviamente e com outros atores. Déda foi o deputado, depois o deputado federal, o Zé Eduardo foi o senador do PT, Déda foi o prefeito, o governador do PT. Então, naturalmente, quando você tem a perda dessas pessoas, que essa densidade eleitoral não é só do partido, ela também é dessas lideranças, você perde.
Terceiro fator: crise nacional que o PT teve. O PT, durante o período da Lava Jato, da prisão de Lula, do golpe contra a presidenta Dilma, o PT acabou perdendo parte considerável do seu eleitorado. Parte do eleitorado petista que migra para o bolsonarismo, uma parte das classes médias, digamos assim, migra para o bolsonarismo. Digamos assim, que era uma parte mais e “moralista”, que compreendia o PT como um partido da ética e deixou-se levar ali pela bagunça que a Lava-Jato criou no cenário nacional.
Isso chegou aqui para Sergipe, chegou para todas as cidades. Inclusive, de uma forma muito dura. Lembro que em 2016 eu fui candidato, a gente passava pela rua com camisa vermelha e o povo chamava de ladrão. O PT estava todo dia no Jornal Nacional com a Lava Jato, passava Sérgio Moro… só três anos, quatro anos depois que a gente veio descobrir o que foi a Lava Jato. A situação de conluio entre o Ministério Público e o juiz Sérgio Moro. E só agora, recentemente, que a Lava Jato foi anulada. Então, você tem um processo que foi muito duro para todo mundo. A gente de Sergipe, nesse processo de reconstrução, isso pegou a gente muito forte.
Então, é um ponto assim interessante. E acho que a gente tem um quarto elemento aqui. Que para a gente em Aracaju foi muito significativo, que foi Edvaldo Nogueira. Ele utilizou de todas as formas que ele podia na Prefeitura de Aracaju para desfazer as nossas chapas, para cooptar lideranças do PT e levar para outros partidos. Para o PCdoB, para o PDT. Ele fez um processo muito duro de cooptação das nossas lideranças, de perseguição.
Ele agiu com muita força para desconstruir o PT em Aracaju, em algumas frentes. E eu vou citar duas. A primeira frente que ele age para desconstruir é nesse processo de cooptação de lideranças e militantes do PT para outros partidos. E o segundo processo que ele fez de desconstrução do PT foi a desconstrução da obra de Marcelo Déda. Déda, enquanto prefeito de Aracaju, ele fez muitas obras que inclusive jornalistas da época chamavam de obras tamanho P. Que eram obras que de fato influenciavam na vida direta do povo. Eram praças novas, eram UBSs novas, eram postos de saúde, eram novas creches. E o que Edvaldo fez? Ele desconstruiu isso!
Se for olhar as praças de Aracaju, que era a grande marca do PT e de Déda, foram todas desconstruídas, todas desfeitas, ele deixou tudo abandonado. Talvez o maior símbolo disso seja o Museu do Mangue, que fica na Coroa do Meio.Veja, a Coroa do Meio Déda tirou das palafitas, fez um museu, produziu tudo na Coroa do Meio. Edvaldo não chegou nem a inaugurar o Museu e pouco tempo depois o Museu do Mangue pegou fogo. Até hoje tá lá daquele jeito. Edvaldo foi isso, mas a gente sobreviveu e nós vamos retomar nosso papel.

AC: Há uma percepção de que o PT perdeu capacidade de formar novas lideranças e se renovar. Muitos acreditam que, para ter espaço, é preciso já ser de uma família tradicional da política, ter recursos financeiros ou vir com uma liderança já consolidada. Como sua gestão pretende democratizar a participação política no PT e incentivar o surgimento de novas lideranças?
CD: Venho de uma nova geração do PT, que faz o possível para que essas novas gerações também tenham protagonismo. Então, a gente tem muita frente de atuação hoje nas comunidades e o que mais busco nas comunidades, no processo de criação de novas lideranças, é observar novas lideranças jovens para participar disso. Então, o que nós temos que fazer nesse processo? Aposto muito na criação dos núcleos de base, na retomada dos núcleos de base, mas, principalmente, muita formação política. E tem um terceiro ponto que acho fundamental: não existe novas lideranças criadas na burocracia. Ou a militância petista se se constrói na luta das pessoas, reconhecendo a cidade, participando de greves dos servidores, de trabalhadores, de ocupações de sem teto, de uma panfletagem, de um porta a porta… ou a militância do PT se reconstrói dessa forma, ou nós não vamos conseguir fazer novos militantes surgirem.
A militância só se constrói na luta. Como é que uma liderança se forma na burocracia? Dentro de espaço de poder, com muito cargo para distribuir isso para suas lideranças e refazer assim novos colégios eleitorais, vamos dizer assim. E isso o PT não tem, na verdade isso o PT nunca teve. Mas uma parte da militância dessas últimas décadas, desses últimos anos, enquanto o PT governou o estado, a prefeitura, se construiu dessa forma. Essa não é uma realidade mais.
Então, ou o PT dialoga e as novas lideranças aprendem e se formam no meio do povo, participando das lutas do povo, ou não tem novas lideranças. Para mim, você pode colocar o curso de formação que quiser, pode ensinar O Capital da primeira página a última, lendo com ele, método Josué de Castro, linha por linha e debatendo. Se a pessoa não souber o que é povo. Se ela não sentir o que é povo, ela nunca vai conseguir se constituir liderança.
AC: Hoje, apenas o PSOL e o PT se mantêm na oposição tanto ao governo de Fábio Mitidieri quanto ao de Emília Corrêa. Mesmo assim, os dois partidos não têm atuado em conjunto. Caso eleito, sua gestão buscaria fortalecer o diálogo e a cooperação com o PSOL em Aracaju?
CD: A gente tem uma boa experiência na câmara. A gente compõe um bloco de oposição e a gente tem atuado muito em conjunto. Na eleição passada, de 2024, eu cheguei a sugerir, você repercutiu no Sergipense, que precisávamos ter uma candidatura única das esquerdas em Aracaju. Olhava o cenário e eu dizia, você tem aqui uma candidatura do União Brasil, você tem uma candidatura do PDT, que representa essa mesmice que é Edvaldo, você tem uma candidatura do PL… você tem um espaço aberto para construção de uma candidatura alternativa a isso. Eu acho que, naquele processo, o PT chegou numa quantidade fantástica de votos para uma candidatura colocada muito em cima da eleição.
A gente teve uma votação muito expressiva de votos, a votação do PSOL também foi muito boa. Agora, imagine se a gente se junta? Se a gente tivesse uma candidatura junto? É muito difícil você falar de cenários que não existiam né?! Ah, se a gente estivesse junto a gente ganhava a eleição? Ninguém consegue decifrar isso e dizer sim ou não. Mas, acredito que se reunisse essas duas candidaturas, de Candisse e Niully, a gente conseguiria construir uma unidade e mais que uma unidade, a gente conseguiria construir uma empolgação da militância e uma militância empolgada ela toma as ruas com muita força, tinha dúvida nenhuma que ali a gente chegava no segundo turno.
É tanto que, depois, se você olhar aconteceu, dois fenômenos aconteceram bem interessantes na eleição do ano passado. O primeiro é que acabou sendo construído uma um voto útil de uma parte progressista da cidade na candidatura de Luiz Roberto, por medo de Yandra [de André Moura] ir para o segundo turno. E, obviamente, que esse voto útil seria do PT e do PSOL se a gente tivesse junto. Porque veja, nas primeiras pesquisas Candisse já saltou para 9 pontos. Então, se a gente estivesse junto, criava um sentimento mais interessante na cidade.
E o segundo ponto é que todo mundo imaginava que Yandra teria uma votação muito interessante e a cidade de Aracaju já provou que rejeita André Moura e seus tentáculos, como diria Isac. A gente tem que olhar para essas situações e ver, a gente tem que ter juízo, ninguém chega sozinho a lugar nenhum.
Eu miro em termos protagonismo em Aracaju, nós vamos voltar a ter protagonismo, e eu miro da gente ter aliança daqui a três anos para disputar uma eleição com muita força. E eu não tenho dúvida nenhuma que qualquer candidatura colocada por esse bloco unido chega com mais de vinte por cento no primeiro turno e vai para o segundo turno.

AC: Deixo espaço para suas considerações finais.
CD: A gente lança essa candidatura a presidente do diretório municipal com o objetivo de reoxigenar o nosso Partido dos Trabalhadores. Nesse último período, nós tivemos mais de cinco mil filiações no PT em Aracaju, são novos filiados que se somam ao processo de fortalecimento do governo Lula e fortalecimento do partido do presidente Lula. É gente que quer ajudar a construir.
O que acho é que a gente tem que conseguir fazer um grande balaio que dê numa síntese interessante. A gente precisa trazer filiados antigos e atores que ajudaram a fundar o PT nos anos 80, por exemplo. Gente que foi decisiva para as vitórias já nos anos 2000. De Deda, de Zé Eduardo, na década de 90. Gente que foi decisiva para a gente virar o jogo da história. Agora em 2016, com o impeachment de Dilma, prisão de Lula, gente que fez fora Bolsonaro.
A gente tem que construir uma síntese que em toda essa militância consiga enxergar no Partido dos Trabalhadores a sua casa, para retornar para a sua casa e para a gente retomar um protagonismo que sempre foi nosso. Eu não vou liderar isso sozinho, a gente tem um conjunto de correntes que nos apoiam e que acreditam nessa eleição nossa como capaz de trazer protagonismo para o PT novamente em Aracaju. Essa tem que ser uma missão de toda essa militância que esteve e que está no Partido dos Trabalhadores.
Durante esse período, vamos acelerar muito o diálogo com os velhos militantes, com os novos militantes e com os que estão para chegar no PT. Que isso vire um grande caldo que tenha força e capacidade social para a gente avançar e retomar o protagonismo que sempre foi petista em Aracaju. Por isso que o nome da nossa chapa é “Militância Presente”. A gente precisa de militância presente em todos os cantos da cidade de Aracaju para retomar esse protagonismo.
Comentarios