Laércio Oliveira foi o único senador sergipano a votar a favor de projeto que ataca proteção ambiental
- André Carvalho
- 23 de mai.
- 7 min de leitura

Laércio Oliveira (PP) tem sido muito coerente em seu mandato, sempre atuando na contramão das boas matérias legislativas. Após ser o único senador sergipano a votar contra as cotas raciais em universidades públicas, o senador foi o único de Sergipe a votar favoravelmente pela flexibilização da proteção do meio ambiente. Rogério Carvalho (PT) votou contra e Alessandro Vieira (MDB) estava de licença.
No Senado, Laércio Oliveira e outros 53 senadores aprovaram o Projeto de Lei nº 2159/2021, que, sob relatoria de Tereza Cristina (PP), ex-ministra do governo Bolsonaro, estabelece um novo marco legal para o licenciamento ambiental. Apenas PT e PDT votaram unanimemente contra a proposta, enquanto o PSB registrou um voto contrário e o PSD, dois. O texto, que enfraquece o rigor ambiental vigente, cria novas diretrizes para o processo de licenciamento. Como foi alterado no Senado, o projeto retorna agora à Câmara dos Deputados. Se aprovado novamente, seguirá para sanção ou veto presidencial.
Sob o comando de Marina Silva (REDE), o Ministério do Meio Ambiente lançou nota contra o texto, o qual considera representar “a desestruturação significativa do regramento existente”, ameaçando a segurança socioambiental do país. Como demonstrado na nota, o texto enfraquece a proteção e relativiza a previsão da Constituição Federal, “que garante aos cidadãos brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com exigência de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de qualquer obra ou atividade que possa causar prejuízos ambientais”.
Outro ponto relevante apresentado pelo ministério está na completa omissão do texto em relação às mudanças climáticas, que comprometem direitos e a segurança da população brasileira, assim como a capacidade produtiva do mercado agrícola brasileiro. A avaliação da pasta é que o texto permite retrocessos ambientais, algo que contraria a jurisprudência brasileira.
Um dos mecanismos tradicionais de quem quer agredir o meio ambiente é tentar descentralizar as normas ambientais, permitindo que interesses locais atuem com maior facilidade para relativizar a proteção ao meio ambiente. Atualmente, um órgão estadual não pode adotar diretrizes mais flexíveis do que as estabelecidas nacionalmente, somente mais duras.
“Ao permitir que a definição de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental ocorra sem coordenação nacional e fora do âmbito de órgãos colegiados, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais e Municipais, o projeto pode promover a ação descoordenada entre União, Estados e Municípios no processo de licenciamento ambiental e desarticular os mecanismos de participação social. O PL é, por fim, omisso em relação à crise climática, sem sequer mencionar a questão em seu conteúdo, fazendo com que o processo de licenciamento desconsidere esse tema crucial”, diz a nota.
Um dos pontos mais preocupantes do projeto de lei é o aumento do uso da Licença por Adesão e Compromisso, quando a autodeclaração do proponente pela atividade ou empreendimento basta, sem a necessidade de ser licenciado de forma mais controlada pelos órgãos ambientais. O descompromisso é tanto que dispensa estudos aprofundados para duplicação de rodovias, mesmo em regiões habitadas por comunidades vulneráveis. “Esses empreendimentos seriam monitorados por amostragem, dispensando a necessidade de fiscalização, pelo órgão ambiental, de todos os empreendimentos licenciados por essa modalidade”, explica a nota.
A atuação de Laércio Oliveira em favor desse texto é vergonhosa para o povo sergipano. Estamos vivenciando tempos mais duros sob a perspectiva climática, afetando diretamente a segurança de nossa população e a capacidade produtiva de nossa agricultura. O Estado deve preservar o meio ambiente, pois, como aponta a Constituição, esse é um bem coletivo. Flexibilizar o cuidado de um bem coletivo para favorecer o interesse econômico de poucos é um despropósito. Ver isso acontecer com a digital de um representante do nosso povo sergipano é constrangedor.
Veja a nota na íntegra:
"Em trâmite no Congresso Nacional, o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que dispõe sobre o licenciamento ambiental, representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país. Além disso, afronta diretamente a Constituição Federal, que no artigo 225 garante aos cidadãos brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com exigência de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de qualquer obra ou atividade que possa causar prejuízos ambientais.
O texto também viola o princípio da proibição do retrocesso ambiental, que vem sendo consolidado na jurisprudência brasileira, segundo o qual o Estado não pode adotar medidas que enfraqueçam direitos. Contraria, ainda, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceram a inconstitucionalidade da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio impacto ambiental.
Ao permitir que a definição de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental ocorra sem coordenação nacional e fora do âmbito de órgãos colegiados, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais e Municipais, o projeto pode promover a ação descoordenada entre União, Estados e Municípios no processo de licenciamento ambiental e desarticular os mecanismos de participação social. O PL é, por fim, omisso em relação à crise climática, sem sequer mencionar a questão em seu conteúdo, fazendo com que o processo de licenciamento desconsidere esse tema crucial.
Portanto, a proposta terá impacto negativo para a gestão socioambiental, além de provocar, possivelmente, altos índices de judicialização, o que tornará o processo de licenciamento ambiental mais moroso e oneroso para a sociedade e para o Estado brasileiro.
É fundamental que o Poder Legislativo assegure o equilíbrio entre a celeridade desejada pelos setores produtivos e a necessidade de preservar os instrumentos essenciais à proteção ambiental. Um marco legal eficaz deve promover o desenvolvimento sustentável com base em critérios técnicos, transparência e responsabilidade institucional, em consonância com os princípios constitucionais que regem a tutela do meio ambiente.
A seguir, os principais retrocessos trazidos pelo PL 2.159/2021:
Licença por Adesão e Compromisso (LAC)
Um dos pontos mais críticos do PL é a aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), modalidade simplificada de licenciamento baseada na autodeclaração do empreendedor. A proposta permite que empreendimentos de médio porte e potencial poluidor utilizem esse mecanismo sem a exigência de estudos prévios de impacto e sem a definição de condicionantes ambientais específicas.
Na prática, o texto permitiria o uso da LAC para um percentual expressivo de empreendimentos que atualmente são licenciados. Além disso, esses empreendimentos seriam monitorados por amostragem, dispensando a necessidade de fiscalização, pelo órgão ambiental, de todos os empreendimentos licenciados por essa modalidade.
A proposta também prevê a aplicação da LAC a projetos como duplicação de rodovias e dragagens, inclusive em regiões sensíveis e habitadas por comunidades vulneráveis, que podem ser autorizados sem qualquer análise técnica prévia, aumentando o risco de danos ambientais e sociais.
Outra questão alarmante é a utilização da LAC como instrumento de regularização de empreendimentos em operação sem qualquer licença ambiental. Para o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), a LAC deveria ser adotada somente para projetos de pequeno porte, baixo impacto e que não envolvam áreas sensíveis, sempre com verificação do Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE) por parte do órgão licenciador.
Fragilização do SISNAMA e do papel do ICMBio
O PL retira atribuições técnicas e normativas dos órgãos colegiados do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais. Ao transferir competências decisórias para entes federativos de forma descoordenada, pode estimular uma “concorrência antiambiental” entre estados e municípios, que, no intento de atrair mais investimentos, poderão oferecer flexibilizações e padrões menos rigorosos que os municípios ou estados vizinhos, comprometendo a uniformidade dos critérios e a efetividade da fiscalização.
Além disso, o texto enfraquece o papel do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ao permitir que empreendimentos em unidades de conservação sejam licenciados sem a manifestação obrigatória prévia do órgão gestor da área. Segundo o MMA, tal alteração representa o enfraquecimento do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e abre margem para que empreendimentos impactem diretamente áreas protegidas, como Parques Nacionais e Estações Ecológicas Federais, sem o devido controle.
De modo similar, a proposta determina que a manifestação dos órgãos competentes pela proteção de Terras Indígenas ocorreria somente em relação a áreas homologadas e territórios quilombolas já titulados. A não conclusão do processo de reconhecimento formal dos territórios indígenas ou quilombolas pelo Estado não significa que neles não existam comunidades que devem ser ouvidas, conforme determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. O descumprimento desse direito pode gerar questionamentos judiciais que provocarão atrasos e conflitos para o processo de licenciamento.
Omissão ante impactos indiretos e sinérgicos
Outro ponto apontado como retrocesso é a exclusão, pelo PL, das áreas de influência indireta (AII) nos estudos de impacto ambiental. A medida compromete a análise de impactos cumulativos, como desmatamento, pressão sobre comunidades indígenas, contaminação de corpos d’água e grilagem de terras — frequentemente decorrentes de grandes empreendimentos como hidrelétricas, estradas e portos.
Para o MMA, a impossibilidade de prever e mitigar esses impactos prejudica a capacidade do Estado de garantir o equilíbrio ecológico e a justiça socioambiental, ampliando o risco de judicialização e atrasos nos projetos.
Questionamento de condicionantes e dispensa para atividades agropecuárias
Além disso, a proposta admite que os empreendedores questionem o estabelecimento de condicionantes ambientais de impactos indiretos com base na ausência de “nexo causal comprovado” ou por não terem “poder de polícia” sobre as ações de terceiros.
A comprovação do nexo causal direto pode dificultar ou inviabilizar a imposição de medidas preventivas e compensatórias, tendo como exemplo o caso da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em que a dificuldade em atribuir responsabilidade por impactos indiretos comprometeu a reparação de danos às comunidades afetadas e ao meio ambiente.
A possibilidade de que o empreendedor questione condicionantes sob o argumento de não ter ingerência sobre terceiros ou poder de polícia traz uma ampla gama de possibilidades de questionamentos com o potencial de gerar dúvidas, resultando em insegurança jurídica e maiores prazos para o processo.
O PL prevê ainda que atividades como agricultura e pecuária sejam dispensadas de licenciamento ambiental caso estejam inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou aderidas ao Programa de Regularização Ambiental (PRA). O MMA alerta que esses instrumentos não avaliam impactos como uso excessivo de água, poluição do solo e pressão sobre áreas de preservação, podendo legitimar danos significativos sem análise técnica."
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